Muitas das chamadas artes tradicionais da África estão sendo
ainda trabalhadas, entalhadas e usadas dentro de contextos tradicionais. Mas,
como em todos os períodos da arte, importantes inovações também têm sido
assimiladas, havendo uma coexistência dos estilos e modos de expressão já
estabelecidos com essas inovações que surgem. Nos últimos anos, com o desenvolvimento
dos transportes e das comunicações dentro do continente, um grande número de
formas de arte tem sido disseminado por entre as diversas culturas africanas.
Além das próprias influências africanas, algumas mudanças
têm sua origem em outras civilizações. Por exemplo, a arquitetura e as formas
islâmicas podem ser vistas hoje em algumas regiões da Nigéria, em Mali, Burkina
Faso e Niger. Alguns desenhos e pinturas do leste indiano têm bastante
similaridade em suas formas com as esculturas e máscaras de artistas dos povos Ibibio
e Efik que se estabelecem ao sul da Nigéria. Temas cristãos também tem sido
observados nos trabalhos de artistas contemporâneos, principalmente em igrejas
e catedrais africanas. Vê-se ainda na África, nos últimos anos, um desenvolvimento
de formas e estruturas ocidentais modernas, como bancos, estabelecimentos
comerciais e sedes governamentais.
Os turistas também tem sido responsáveis por uma nova
demanda das artes, particularmente por máscaras decorativas e esculturas
africanas feitas de marfim e ébano. O desenvolvimento das escolas de arte e
arquitetura em cidades africanas tem incentivado os artistas a trabalhar com
novos meios, tais como cimento, óleo, pedras, alumínio, com uma utilização de
diferentes cores e desenhos. Ashira Olatunde da Nigéria e Nicholas Mukomberanwa
de Zimbábue estão entre os maiores patrocinadores desse novo tipo de arte na
África.
A luta da África pela independência, tal como noutras partes
do mundo colonizado, não se limitou a uma luta pela autodeterminação política,
mas também pela libertação do seu povo de todas as estruturas de dominação e de
opressão.
Só dispondo da plena liberdade das suas capacidades físicas
e mentais, se é capaz de melhorar as condições em que se vive e desenvolver a
sua própria cultura. À medida que as nações africanas se foram libertando,
dando livre curso às aspirações até então reprimidas ou mantidas sob controle
pelos regimes cessantes, surgiu uma súbita explosão de nova criatividade no
sentido da modernização das forças produtivas em várias partes de África. Mas,
uma vez que as ideias de modernidade eram importadas do Ocidente juntamente com
os meios e os conhecimentos da modernização, este fato, criou um problema
fundamental de natureza filosófica para as aspirações da África, para a sua
identidade pós-colonial, a sua concepção do mundo e visão moderna próprias.
A África possui hoje tudo o que é necessário para ser parte
do mundo moderno. Possui fábricas modernas, aviões, linhas aéreas, os carros
mais recentes, autocarros e caminhões, rádios e televisão a cores, gravadores
de vídeo, computadores e celulares, cybercafés e jogos de computador, hotéis
modernos com todas as comodidades que se podem encontrar em Londres, Paris, ou
Nova Iorque, alimentos importados, Coca-Cola e hambúrgueres, etc., etc. Certo é
que não ficou para trás na aquisição de tudo o que exige uma moderna sociedade
de consumo. Não seria surpreendente verificar que os filhos das famílias ricas
se passeiam usando roupas importadas de Paris e empunhando os últimos modelos
de celulares com transmissão de imagem. Parece que a África quer ter tudo o que
o Ocidente produz e possui, sem procurar saber se este desejo de importar tudo
é ou não do interesse da África.
A África é um vasto continente com mais de cinquenta países
independentes, e as condições variam de país para país, quanto à diferença de
recursos e de níveis de desenvolvimento, e seria errado pô-los todos no mesmo
plano e homogeneizar a situação. Seria também pouco razoável não referir que,
apesar de todas as dificuldades, a África tem alcançado grandes realizações,
particularmente na literatura, cinema e música modernos. Há também
consideráveis sucessos nas artes visuais, embora faltem instrumentos críticos
para reivindicar e celebrar tais realizações. Sei, no entanto que há muito
trabalho original que se faz nos departamentos universitários de filosofia e de
história da arte por toda a África, em especial na Nigéria e na África do Sul.
Mas estes estudos têm pouco impacto e pouca relação com a produção e a compreensão
daquilo que hoje se passa nas artes visuais.
A história do modernismo não é simplesmente uma narrativa de
vários momentos e dos seus principais atores, representando antes um corpo de ideias
filosóficas que sustentam e legitimizam o seu etnocentrismo. Estas ideias
recuam até à filosofia da história e à sua subjetividade formulada e
racionalizada pelos filósofos europeus.
A modernidade começou a sua viagem na Europa, e na sua
trajetória para conquistar o mundo transformou-se por seu turno num instrumento
da barbárie. Mas havia outra face da moeda que articulava e prometia um mundo
moderno no qual todos os seres humanos seriam iguais, e esta igualdade seria
levada a cabo através das ideias racionais do progresso. A fome, a pobreza e a
doença seriam universalmente eliminadas com o progresso da ciência e da
tecnologia. Mas será que a modernidade cumpriu as suas promessas? Se a resposta
for negativa, então devemos examinar as razões desse fracasso. Será que o
fracasso se deve às ideias propriamente ditas, ou antes, ao sistema que usou
tais ideias no seu próprio interesse? Se estas ideias da modernidade estão
encurraladas num sistema de dominação e de exploração, então o que é preciso
não é condená-las como eurocêntricas, mas libertá-las das garras ocidentais.
O principal problema do modernismo na arte na África em
geral (digo em geral, porque há exceções, a que me referirei mais adiante) é
que parece sofrer de uma síndrome de dependência, deixando por consequência o
artista numa constante porfia para estar a par do que se faz no Ocidente.
Existem, obviamente, obras de arte que parecem profundamente africanas, mas
essa aparência é enganadora. Muitas vezes, não passa de um verniz por cima
daquilo que teve origem no Ocidente.
Atualmente, parece que as coisas mudaram. Até há cerca de
dez anos, não se via nenhum artista de África, da Ásia, das Caraíbas e até
certo ponto mesmo da América Latina em exposições internacionais ou em
bienais. Mas hoje em dia não se realiza nenhuma exposição internacional de importância
sem a participação de artistas dessas partes do globo. O que está por trás
desta mudança repentina? Há muitas explicações, tanto a favor como contra tal
mudança, o que torna a matéria complexa. Mas poderemos simplificar o caso
dizendo que foi, sobretudo a globalização da economia capitalista, e com ela a
expansão do mercado da arte e o espetáculo do multiculturalismo, que criou a
procura de obras de arte de todo o mundo.
A questão é que, embora a África tenha entrado com sucesso
no mundo moderno, isso não se fez em larga medida obedecendo aos seus próprios
termos, nem segundo as suas necessidades sociais. Foi antes forçada a isso pelo
sistema global que agora determina e controla tudo aquilo a que a África
aspira, incluindo a sua produção e avaliação artísticas. Mas o sistema não pode
funcionar de modo eficaz ao prosseguir exclusivamente o seu próprio interesse
sem mostrar algum altruísmo ou preocupações com o bem-estar dos outros; tem de
criar um espaço onde sejam atribuídos alguns papéis aos outros e recebam alguma
gratificação. E à medida que o mercado artístico se expandia e diversificava as
suas atividades, comprando e vendendo coisas de todo o mundo, as portas
abriam-se para alguns artistas, críticos de arte, e curadores africanos â assim
como para alguns asiáticos e latino-americanos â dispostos a servir o sistema.
Em resultado disso, alguns artistas, críticos de arte e curadores, que se
ofereceram como autoproclamados representantes das partes do mundo de onde eram
originários, conseguiram fazer carreiras de sucesso no estrangeiro. Mas no
interior de África a situação mantém-se precária, confusa e desanimadora. Assim
privados do desenvolvimento dos seus próprios recursos, tanto materiais como
intelectuais, no interior de África, não foi possível desenvolver
suficientemente as suas próprias instituições modernas. Sem tais instituições,
não só é extremamente difícil aos estudiosos levar a cabo qualquer trabalho de
investigação e produzir ideias susceptíveis de fornecer um quadro capaz de
interpretar o trabalho dos artistas africanos e de legitimar o seu significado
sociocultural, como ainda a África se vê obrigada a olhar constantemente para o
Ocidente em busca de reconhecimento e legitimação daquilo que fazem os seus
artistas.
Fonte:
Não sei de quem é esse texto. mas me pareceu bem escrito e encontra-se por
todos os cantos da internet.
Foto: Cerâmica da artista queniana Magdalene Odundo
Obs: Há pontos de vista do autor que discordo, mas considerando-se que este é um texto de alguns anos atrás, ja está desatualizado em algumas considerações.