O conflito endêmico (constante) na performance Agemo está
expresso no ato de praguejar. Além disso também emerge em ocasiões públicas
pelo jogo de empurra, quando os ânimos esquentam e explodem. Sempre que os
sacerdotes Agemo se reúnem, tentam fazer, de certa maneira, pequenas desfeitas
entre si.
Desde 1892, quando os britânicos ocuparam o país e proibiram
sacrifícios humanos, desencadeou-se uma série de conflitos pela posse das vacas
que tomaram lugar nessas oferendas Atualmente considera-se de mau gosto
perguntar a um sacerdote Agemo, qual parte da vaca sacrificada ele recebe. De
acordo com uma versão da tradição oral, a quantidade de sacrifícios humanos
chegou a tal ponto que o Awujale (chefe) foi forçado a dispersar os sacerdotes
da periferia de seu território, para evitar repercussões.
Ha outra historia sobre um sacerdote, o Orimolusi de
Ijebu-Igbo, que foi expulso permanentemente da sociedade por ter perdido seu
carrego de artefatos sagrados em uma inundação durante sua peregrinação.
Conta-se uma historia semelhante a respeito de Adie, (ver foto acima), um dos
sacerdotes travestidos, que também perdeu seu carrego em uma enchente, não
sendo mais aceito como performer nas cerimônias de máscaras, o que ele nega.
Na peregrinação que acontece em meados de Agosto, durante a
festividade de Ajagaloru Agemo em Oru ha 24 quilômetros ao norte de Ijebu-Ode,
uma disputa dentro de uma determinada facção levou alguns dos participantes a
retirar-se da apresentação, deixando de exibir a sua performance de esteiras dançantes
(Eleni).
Veja o vídeo
Ao partirem em retirada
levando seus carregos para o santuário, foram incomodados pelo motorista de um
carro novo com uma mulher sentada no banco de trás, que tentava ultrapassar os fie
em procissão. O grupo deteve o automóvel e quebrou o quebra-vento. Na Nigéria,
onde as peças de automóvel são difíceis de serem obtidas e portanto muito
caras, devido à situação econômica dos país, agravou o incidente levando a
considerá-lo como uma retaliação grave. A mulher procurou imediatamente o rei
da comunidade para registrar sua queixa. O rei retrucou para os donos do carro
que não havia como ajudá-los pois uma mulher não pode sair pela rua na ocasião
dessa festividade. Por ali estar ela sujeitou-se a uma provocação, causando
esse problema. O rei disse-lhe que poderia levar essa questão para a justiça,
apesar de não acreditar que ela tivesse chances de ser ressarcida.
Na sequencia desse capítulo, a autora dá vários exemplos de
histórias como essas.
As performances Agemo diferem dos conflitos entre grupos
formalmente definidos social e politicamente. Não são meras encenações,
batalhas de palco, ou expressões de hostilidade controlada. Trata-se de jogos
de poder entre o sacerdotes e os demais, que geram verdadeiros conflitos e
hostilidades entre autoridades individuais que se opõe entre si em vários
aspectos. Além disso, os conflitos não se limitam apenas às questões rituais,
eles se estendem à vida cotidiana dos sacerdotes.
As performances Agemo refletem as tensões entre as
personalidades dos indivíduos expressando os conflitos dentro da coletividade.
Como grupo politico e religioso, Agemo é privativo e tende a forçar divisões de
poder e distinções classificatórias dentre os grupos moderados, enfatizando as
facções e conflitos de interesses separatistas. As peregrinações e reclusões
nos bosques sagrados dos sacerdotes Agemo constroem uma comunidade normativa em
apenas um nível. Existe certa solidariedade entre os sacerdotes em relação aos
de fora que está expressa nos segredos que eles guardam a respeito do que viram
nos bosques sagrados, principalmente na primeira noite quando acontecem as
danças Posa, e no seu isolamento das mulheres. Tudo isso porém acaba sendo
minado devido aos conflitos de personalidades fortes que está presente no amago
do caráter Agemo.
Os sacerdotes agemo possuem um centro administrativo fora do
santuário, que fica nas proximidades de Isasa e Ijebu-Ode. No passado esse
centro era chefiado pelo Awujale (chefe) juntando todas as áreas dispersas numa
confederação. A razão histórica para essa confederação parece ter sido o
controle do comercio através do território. O título "Dono-do-Mercado,”
Olojá, usado pelos sacerdotes, denota o vínculo com o comercio. Antes de saírem
em peregrinação para Imosan, cada sacerdote oferece um sacrifício em seu
próprio mercado. De fato o povo de Ijebu é considerado tradicionalmente um povo
comerciante.
Há também um traço de sacralização dos mercados. A mãe
ancestral do sacerdote Nopa está enterrada em seu mercado em Odonopa. Hoje ha
uma lápide que indica esse local. Os locais mais convencionais para enterrar os
patriarcas falecidos estão, todavia sob o piso das casas. As mulheres não
apenas controlam os mercados mas a sua linhagem determina a hereditariedade dos
sacerdotes Agemo.
Nos idos de 1508, os explorador português Duarte Pacheco
escreveu sobre uma grande cidade chamada "Geebu”... O comercio aqui é o de
escravos que podem ser trocados por braceletes (manillas) doze ou treze para
cada escravo e alguns dentes de elefante." . Os Ijebu , instalados na costa
eram os intermediários durante os séculos dezoito e dezenove entre o império de
Oyó e o comercio exterior coletando tarifas de quem passasse pelos seus
territórios. E conforme a observação de Ogunba, as cidades aonde residiam os
sacerdotes Agemo estão bem próximas das muralhas de terra que circundavam o
reino de Ijebu, que Pacheco havia se referido nos inicio do século dezesseis.
Yoruba Ritual
Este livro de Margaret Drewal é um mergulho para dentro â da
liberdade do ritual ioruba, o poder de improvisação de seus intérpretes, e o
desejo de seus participantes em alternar as possibilidades de entretenimento.
Suas implicações são diretas na diáspora americana, devido à presença desses
artifícios, que constituíram a chave para a sua adaptação em novos ambientes,
base fundamental para aquilo que Stuart Hall chamou de â estética da diáspora.
A estrutura política dos iorubas foi historicamente baseada
em governos representativos abertos, nos quais faziam parte conflitos e
competições entre reis, descendentes. mas também entre chefes facções em
disputas com os sacros monarcas. As funções politicas dos rituais iorubas
excluem frequentemente certas categorias de pessoas, e incluem jogos de poder
entre seus participantes ou entre eles e outros grupos.
African Diaspora Program
De Paul University
Margaret Thompson Drewal
Margaret Thompson Drewal é uma teórica das artes
performáticas, historiadora de dança, e etnógrafa. Ela estudou os rituais
iorubas da África ocidental e afro-brasileiros. Além de danças populares
norte-americanas e entretenimentos da virada do século XIX, incluindo
espetáculos apresentados nas primeiras Exposições Internacionais. Drewal possui
especial interesse na poética e política do discurso performático. Ela também
teve experiência profissional como bailarina e coreógrafa.