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sexta-feira, 4 de maio de 2012

Improvisos no Ritual

Ritual Ioruba - interpretes, espetáculo, desempenho

É mais fácil detectar a improvisação numa mescla cultural, quando vemos o emprego de elementos industrializados inseridos em contextos em que não lhes pertencem. Como exemplo: ao vermos mascarados tribais usando fraques, máscaras de dia das bruxas feitas de látex, mascaras de gás e tênis. Ou quando os mascarados seguram livros de bolso, e brinquedos de plástico adornando suas cabeças. Da mesma maneira que Drewal viu em 1978, um mascarado Egungun vindo de uma aldeia Imasai na cidade de Egbado falar, com a sua voz rouca e gutural em inglês Pidgin (um tipo de dialeto), ao imitar um comediante popular conhecido por Baba Sala da radio e televisão nigeriana.
Porém torna-se mais difícil de perceber quando a mistura cultural é local, de mascaras entalhadas por culturas vizinhas, como a dos povos Ibibio (sudeste da Nigéria), serem utilizadas no ritual iorubano em apresentações para turistas, a menos que o observador tenha um bom conhecimento dos estilos. Por serem representações de espíritos ancestrais, tais mascaras referem-se ao passado, e os adereços contemporâneos realçam muito mais a divergência com o convencional do que sua similaridade.
A autora acredita que não é acidental que a mesma palavra usada para designar espetáculo (ere), é a mesma usada para falar de uma geração de gente que nasceu no mundo ao mesmo tempo. Tanto na performance do ritual quanto na noção de descendência, há simultaneamente uma continuidade e uma transformação. A mascara de gás usada na II guerra mundial torna-se o rosto do espírito, e bonecas de plástico tornam-se os andrajos espirituais, por uma síntese que mescla essas praticas. Meras possibilidades ou potenciais tornam-se a nova representação sintetizada. E quando as novas sínteses tornam-se populares, podem disseminar-se amplamente, causando mudanças em todo o conjunto de mascaras. Nesses casos, a nova síntese (exceção) tende a tornar-se regra.
Pela sua mobilidade e instabilidade, o ritual ioruba é mais moderno do que o próprio modernismo. Durante os anos 1970, os lucros como o óleo trouxeram prosperidade, aumentando o poder de consumo dos nigerianos, possibilitando encenar rituais também nas áreas urbanas. Em Lagos, uma cidade cosmopolita, os trajes de mascaras tornaram-se luxuosos e elaborados, confeccionados com damascos, brocados e veludos importados. O que Drewal viu em sua estadia na cidade ioruba de Egbado era feito com sessenta metros de veludo - mais comprido que a casa aonde era guardado - refletindo as gordas contribuições de dinheiro dos membros dessa casta. Esses trajes conhecidos por baba parikoko simbolizavam por seu longo comprimento a "largueza" das contribuições desses grupos.
As vestes baba parikoko representam os espíritos da linhagem "original” dos Egungun na cidade. Cada qual possuindo um nome próprio que deriva de um (oriki), poema de louvor. Quando acontece um desfile de baba parikoko através da cidade, na sua maneira caracteristicamente morosa, são acompanhados por outras "famílias" de Egunguns que os auxiliam a caminhar, traduzem os seus gestos e entoam cantos de louvor. A procissão adquire poder e distinção para os Egunguns, e por extensão à linhagem que eles representam, através de sua absoluta visibilidade no ambiente. Os acompanhantes da procissão tornam o espetáculo monumental, reforçado pelas mutações no traje baba parikoko durante o desfile. O espetáculo é um exercício de poder que constrói um sentido de personalidade aos participantes, tanto coletivamente quanto individualmente.
Vários grupos isolados desfilam simultaneamente pela cidade - como grupos dispersos - competindo entre si. No baba parikoko eles se juntam e formam um grupo coeso.

Yoruba Ritual

Este livro de Margaret Drewal é um mergulho para dentro da liberdade do ritual ioruba, o poder de improvisação de seus intérpretes, e o desejo de seus participantes de alternar as possibilidades de entretenimento. Suas implicações são diretas na diáspora americana, devido à presença desses artifícios, que constituíram a chave para a sua adaptação em novos ambientes, base fundamental para aquilo que Stuart Hall chamou de â estética da diáspora.

Ivor L. Miller
African Diaspora Program,
De Paul University
http://afrocubaweb.com/ivormiller/IvorIntro.pdf

Margaret Thompson Drewal

Margaret Thompson Drewal é uma teórica das artes performáticas, historiadora de dança, e etnógrafa. Ela estudou os rituais iorubas da África ocidental e afro-brasileiros. Além de danças populares norte-americanas e entretenimentos da virada do século XIX, incluindo espetáculos apresentados nas primeiras Exposições Internacionais. Drewal possui especial interesse na poética e política do discurso performático. Ela também teve experiência profissional como bailarina e coreógrafa.