Sendo o ritual, em grande parte, um sacrifício conjunto, a
quantidade de dinheiro que os participantes disponibilizam nessas ocasiões
deverá representar as suas condições econômicas naquele momento. No modo de ver
dos economistas, as pessoas investem seus rendimentos em cerimônias como
funerais e assentamentos, para reforçar as suas relações de status e
patronagem, como estratégia para competir por riqueza e influência.
A prosperidade econômica da Nigéria nos anos 1970, durante o
"boom" da produção de óleo, não tornou melhores os trajes nem as
cerimonias Egungun, porém permitiu-lhes a proliferação e o florescimento. Da
mesma maneira, baba parikoko (com seus trajes suntuosos) adquiriu proporções
monumentais durante o pico da produção de cacau em Ilaro, no inicio dos anos
50. A monumentalidade das formas era por si só uma revisão do ritual; uma
improvisação que se beneficiou das condições econômicas daquele momento quando
foram criadas.
Quando os iorubas dizem que estão celebrando o ritual
"tal como" seus ancestrais haviam feito no passado, fica implícita a
improvisação nas suas restaurações e recriações. As inovações no ritual,
portanto, não rompem com a tradição, e sim pelo contrário, constituem a
continuidade do espírito de improviso. Nas práticas, a improvisação enquanto um
modo de operação desestabiliza o ritual - tornando-o mais aberto, fluido e
maleável. A progressão do seu roteiro, bem como dos significados que ela gera, é
indeterminada, "trajetórias que obedecem a sua própria lógica". Estas
trajetórias possuem uma relação dialética com o modelo conceitual do ritual
particular de cada indivíduo, numa espécie de processo continuo de avaliação, e
bastante discussão sobre os centros de ritual em relação ás discrepâncias entre
esses modelos e o que "aconteceu de fato".
Levando-se em conta aquilo que os interpretes iorubas
"operam" no ritual reflete seu julgamento daquele momento, seria ingênuo
pensar suas apresentações como encenações e reencenações preconcebidas de algum
passado autoritário - ou mesmo como a representação das regras e convenções da
sociedade. O ritual ioruba, tal como Drewal tenta mostrar, não é uma estrutura
rígida que o participante adere inconscientemente a algum desejo fortemente
assentado de repetições coletivas que sustentam uma ordem social dominante. Se
isso fosse correto talvez a própria cultura devesse ser definida como hegemônica.
E a percepção em geral da incapacidade do homem branco de engajar-se na ação,
ou ainda de reconhecê-la, pode ser tomada como uma evidência empírica. Isso
sugere que deveria dar-se mais atenção à improvisação como práxis (costume), e
ao seu potencial para testar a sua adequação, desafiando as convenções, e ainda
de manipular e transformar as estruturas rituais.
Yoruba Ritual
Este livro de Margaret Drewal é um mergulho para dentro da
liberdade do ritual ioruba, o poder de improvisação de seus intérpretes, e o
desejo de seus participantes de alternar as possibilidades de entretenimento.
Suas implicações são diretas na diáspora americana, devido à presença desses
artifícios, que constituíram a chave para a sua adaptação em novos ambientes,
base fundamental para aquilo que Stuart Hall chamou de â estética da diáspora.
Ivor L. Miller
African Diaspora Program
De Paul University
http://afrocubaweb.com/ivormiller/IvorIntro.pdf
Margaret Thompson Drewal
Margaret Thompson Drewal é uma teórica das artes
performáticas, historiadora de dança, e etnógrafa. Ela estudou os rituais
iorubas da África ocidental e afro-brasileiros. Além de danças populares
norte-americanas e entretenimentos da virada do século XIX, incluindo
espetáculos apresentados nas primeiras Exposições Internacionais. Drewal possui
especial interesse na poética e política do discurso performático. Ela também
teve experiência profissional como bailarina e coreógrafa.