A autora usa os termos "ritual" para designar
etutu, "festival" para odun, "espetáculo para iran, e
"atuação" ou "improviso" para ere. Os iorubas usam
frequentemente as palavras ritual, festival, espetáculo, atuação intercambiável.
As categorias de atuação e espetáculo entre os iorubas são as mais amplas. Eles
concebem o espetáculo como dimensão da realidade permanente e sobrenatural, inacessível
para a experiência humana, ate ser revelada por intérpretes capacitados. De
fato R.C.Abraham traduz iran como "ação teatral". Os iorubas, todavia,
aplicam esse termo para a maioria dos rituais religiosos. As palavra repetições
e transformação (Olabiyi Yai, comunicação pessoal) são intrínsecas ao significado
de iran (espetáculo). Por conseguinte iran deriva do verbo ran; então ranti
(ran eti) significa lembrar; ranfa (ran Ifa) recitar versos; e ranse (ran ise)
enviar recado por um mensageiro, recado esse que será entregue com a
interpretação do mensageiro. Em cada caso, a repetição é uma revisão de tudo o
que for repetido. A palavra iorubá (aworan) para representação visual é baseada
no mesmo princípio de interpretação, assim como espectador (aworan) também é. O
papel dos intérpretes capacitados é o de trazer o outro mundo periodicamente à
luz para que seja experimentado e contemplado. Nesse sentido, o espetáculo ioruba
é, por definição, o reestabelecimento de um comportamento baseado nas praticas
de incorporação dos seus interpretes.
A representação é um conceito mais amplo e genérico do que o
espetáculo. Todo espetáculo ioruba é uma atuação, porém nem toda atuação é um
espetáculo. O que os iorubas entendem por atuação, ere (substantivo) ou sere
(verbo), é muito mais difícil de comunicar, devido à noção capitalista que a
palavra atuação carrega na sua bagagem cultural, que frequentemente se opõe a
noção de trabalho. A realização de um ritual é simultaneamente "trabalho
duro" e "atuação". O que certamente uma atuação não significa
para os iorubas é algo leviano, frívolo e impotente. Eles usam a palavra - yeye
- para designar uma peça frívola, frequentemente traduzida por iorubas para o inglês
como "nonsense" (besteira). Yeye é uma peça gratuita e inútil, um
besteirol. Porém quando os iorubas usam a palavra peça (atuação), referem-se
diretamente a ere ou sere. A atuação - assim como espetáculo ioruba - é, mais especificamente,
engajar-se num processo de participação e transformação que é frequentemente,
mas não constantemente, competitivo.
Yoruba Ritual
Este livro de Margaret Drewal é um mergulho para dentro â da
liberdade do ritual ioruba, o poder de improvisação de seus intérpretes, e o
desejo de seus participantes em alternar as possibilidades de entretenimento.
Suas implicações são diretas na diáspora americana, devido à presença desses
artifícios, que constituíram a chave para a sua adaptação em novos ambientes,
base fundamental para aquilo que Stuart Hall chamou de â estética da diáspora.
Ivor L. Miller
African Diaspora Program,
De Paul University
http://afrocubaweb.com/ivormiller/IvorIntro.pdf
Margaret Thompson Drewal é uma teórica das artes
performáticas, historiadora de dança, e etnógrafa. Ela estudou os rituais
iorubas da África ocidental e afro-brasileiros. Além de danças populares
norte-americanas e entretenimentos da virada do século XIX, incluindo
espetáculos apresentados nas primeiras Exposições Internacionais. Drewal possui
especial interesse na poética e política do discurso performático. Ela também
teve experiência profissional como bailarina e coreógrafa.