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sábado, 24 de setembro de 2011

O Tabuleiro da Baiana



Um pedaço da África se mudou para o Brasil com os escravos. É fácil encontra-lo nos quitutes que as baianas preparam na comida mais “quente” do Brasil. A “quentura” é dada pela pimenta de cheiro ou malagueta.
Da África chegou o azeite de dendê, o quiabo, o inhame, o amendoim, o gengibre. E surgiram os célebres pratos baianos: acarajé abará acaçá, efó, xinxim de galinha... Com muitos segredos que só as baianas sabem...

As baianas do acarajé

Mais do que uma comida rápida de rua, o acarajé é indissociável da cultura do candomblé e da história dos africanos no Brasil. Quitute é elemento central de um complexo cultural.
O acarajé, o principal atrativo no tabuleiro, é um bolinho característico do candomblé. 
Acarajé é uma palavra composta da língua iorubá: “acará” (bola de fogo) e “jé” (comer), ou seja, “comer bola de fogo”. 
Sua origem é explicada por um mito sobre a relação de Xangô com suas esposas, Oxum e Iansã. 
O bolinho se tornou, assim, uma oferenda a esses orixás.
Mesmo ao ser vendido num contexto profano, o acarajé ainda é considerado, pelas baianas, como uma comida sagrada.
Para elas, o bolinho de feijão fradinho frito no azeite de dendê não pode ser dissociado do candomblé.
Por isso, a sua receita, embora não seja secreta, não pode ser modificada e deve ser preparada apenas pelos filhos-de-santo.
A comercialização do acarajé tem início ainda no período da escravidão com as chamadas escravas de ganho que trabalhavam nas ruas, para as suas senhoras (geralmente pequenas proprietárias empobrecidas), desempenhando diversas atividades, dentre elas, a venda de quitutes nos seus tabuleiros.
Ainda na costa ocidental da África as mulheres já praticavam um comércio ambulante de produtos comestíveis, o que lhes conferia autonomia em relação aos homens e muitas vezes o papel de provedoras de suas famílias.
O comércio de rua nas cidades brasileiras permitiu às mulheres escravas ir além da prestação de serviços aos seus senhores:
Elas garantiam, muitas vezes, o sustento de suas próprias famílias, foram importantes para a constituição de laços comunitários entre os escravos urbanos e também para a criação das irmandades religiosas e do candomblé:
Muitas filhas-de-santo começaram a vender acarajé para poder cumprir com suas obrigações religiosas que precisavam ser renovadas periodicamente.
Devido a essa liberdade de movimento é que as escravas de tabuleiro eram vistas como elementos perigosos, tornando-se, por isso, alvos de posturas e leis repressivas.
A venda do acarajé permaneceu como uma atividade econômica relevante para muitas mulheres mesmo com o fim da escravidão.
Hoje, atrás das baianas existem famílias inteiras dependendo dos seus tabuleiros: 70% das mulheres pertencentes à Associação das Baianas de Acarajé e Mingau do Estado da Bahia são chefes de família.
A rotina dessas mulheres é caracterizada pela compra dos ingredientes necessários para o preparo do acarajé, um trabalho diário e árduo:
Precisam levantar cedo, ir à feira, buscar produtos de qualidade a preços acessíveis. O preço do camarão e do azeite de dendê são os que mais variam.
Muitas ainda enfrentam problemas para adquirir tabuleiros novos ou mesmo para guardá-los, deixando-os, muitas vezes, na praia.

Trecho do Registro do Ofício das Baianas do Acarajé.