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quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Museu Ilé Ohun Lailai



Ao entrar no Museu Ilé Ohun Lailai, nos defrontamos com nossas dimensões intrínsecas constituintes, a História do Axé, a de cada Iyalorixá e a idéia do museu:
Em Setembro de 1980, em Lagos-Nigéria, a Iyalorixá Maria Stella de Azevedo Santos sentiu a necessidade de preservar a cultura yorubana através de uma de suas dimensões básicas: a religiosidade.
Pensou em criar um museu do Ilé Axé Opô Afonjá, a fim de dotar esta Comunidade de uma dimensão histórico-cultural, explicitada e continuada, do trabalho de gerações. Propôs em Outubro de 1980 à Sociedade Civil Cruz Santa do Axé Opô Afonjá, a criação de uma comissão para estruturar o museu, o que não ocorreu por diversos motivos.
Em 13 de Novembro de 1981, a Iyalorixá Stella continuava a dizer:
"Eu quero fazer o possível para quando o africano, ou outra pessoa interessada em restabelecer a tradição ritual Ketu, desejar informações, aqui em casa, no nosso Axé, a encontre, uma vez que os cultos originários desta cidade ou nação foram cruelmente destruídos durante a guerra do Abomey em 1886, e nós aqui os preservamos. Oni Kowé, nós precisamos fazer o museu."
"Mo gbó òsán, mo gbó òru", respondi, e comecei a planejar o Ilé Ohun Lailai (Casa das Coisas Antigas).
Com a Iyalorixá buscamos objetos de culto, roupas, dados e datas históricas, enfim um conjunto de elementos demonstrativos e eloquentes de épocas, centralizados nas diversas Iyalorixás.
Conseguiu-se assim uma reconstituição histórica da vida desta Comunidade, seu desenvolvimento e influência na cultura baiana.
Claro que esta reconstituição foi precária ou esquematicamente conseguida, pois muito de objetos e relatos se dispersaram no tempo e espaço; entretanto, o objetivo fundamental do museu, isto é, a transmissão do trabalho de gerações, através de suas crenças, de seus Orixás, de sua vivência cultural yorubá - mesmo fora de seu país - foi feito, e deixado o rastro que buscávamos ressaltar: a presença forte e íntegra da religião e cultura yorubá nesta Casa, pois embora todas as nossas raízes daí provenham a terra que nos alimenta já não é a africana.
Isto deixa muito a pensar. Tradição, preservação, aculturação, distorção, enfim, níveis intrínsecos - essenciais -, e níveis extrínsecos - circunstanciais.
Como intrínseco, essencial, imutável e preservado está o fundamento, a base, a essência religiosa yorubá, muito bem plantada aqui no Ilé Axé Opô Afonjá pela sua fundadora e idealizadora Mãe Aninha (Iya Stella conta que junto com os Axés, Mãe Aninha colocou um correntão de ouro, atitude expressiva de sua inquebrantável fé, visão de longo alcance e desprendimento); os frutos têm sido inúmeros.
Visualizando, enquanto caráter extrínseco é muito interessante constatar as variações sofridas pelas qualidades dos tecidos das vestimentas de Orixás, "supresas" (Ebun Etutu) das festas, devoções católicas e suas resultantes sincréticas, documentação de eventos, etc, etc, como reflexo e função de evolução contextual.
Neste Ilé Ohun Lailai procuramos mostrar como as imanências, essências preservadas e cuidadas, transcendem as dimensões contingentes, circunstanciais: perseguições policiais, distorções ambientais e interesses individuais.
Não é um Museu de Candomblé, nem o apanhado de vivências emocionalmente estruturadas, mas sim um depoimento, um Museu do Ilé Axé Opô Afonjá, sobre a cultura e religião yorubá, da qual o Axé aqui no Brasil é depositário e mantenedor e isto é o que motiva as novas gerações daqui resultantes, pois o Axé bem plantado frutifica quando cuidado.
A dedicação dos yorubas persiste e vive aqui, pois sua maior lição nós aprendemos: tudo depende e está relacionado com o nosso Ori. Cuidando dele cuidamos de nosso Orixá e não o inverso.
- Oni Kòwé -
Salvador, dezembro de 1981