Essa colocação, à primeira vista, pode parecer difícil de
ser aceita, mas, na realidade, os Caboclos que aparecem nos rituais são ditos
batizados e representantes das leis de Deus - talvez uma projeção muito forte
da imagem da catequese. Isso não quer dizer que não exista Caboclos rebeldes,
que fogem às normas comuns. No entanto, é desenvolvida a imagem do caboclo como
o impetuoso, bravo e guerreiro.
Ampliando esses conceitos podemos estabelecer estudos sobre
os Caboclos, observando as características aliadas às técnicas de subsistência,
ou sejam:
Caboclos capangueiros - são aqueles voltados ao pastoreio
do gado bovino, desempenhando todas as funções correntes com essa atividade
econômica. Sua maneira de ser, seus hábitos e atitudes lembram, realmente, o
vaqueiro do Nordeste, trajando sua indumentária em couro, levando chicote, laço
e a montaria que é o cavalo. Baseando-se nessas características, vêm aos
terreiros os Caboclos boiadeiros e capangueiros que mantém elos comuns.
Geralmente esses Caboclos são conhecidos por sua valentia e adestramentos em
conduzir boiadas, girando obrigatoriamente, em torno deles, um folclore típico
das zonas de pastoreio: vocabulário próprio, lendas, alimentos, músicas e
danças.
Caboclos de pena - são ditos mais livres, não estando
presos às atividades econômicas padronizadas, desempenhando seus trabalhos nas
matas, tendo a caça e a pesca como principais fontes de subsistência. Por isso
seus procedimentos diferem dos capangueiros que estão condicionados a normas,
regras e valores dos civilizados, procurando adequar as duas modalidades de
vida em um todo harmonioso e coerente.
Esses dois tipos distintos de Caboclos são encarados nas
práticas dos terreiros como enviados de Zaniapombo, que estão prontos a
praticar o bem, desempenhando papéis de curandeiros, conselheiros, além de
nortear as vidas de seus seguidores.
Paralelamente, o culto dos inquices é
desenvolvido, havendo correlacionamento entre as divindades africanas e os
Caboclos - divindades nacionais - que ocupam, no panorama da mitologia
afro-brasileira, papeis de divindades auxiliares, não possuindo o status de um
deus.
por Raul Giovanni da Motta Lody
Publicado em 1977, Ministério da Educação e Cultura,
Departamento de Assuntos Culturais, Fundação Nacional de Arte, Campanha de
Defesa do Folclore Brasileiro (Rio, RJ).
Raul Geovanni da Motta Lody (Rio de Janeiro, 1952), é um
antropólogo, museólogo e professor brasileiro, responsável por vários estudos
na área das religiões afro-brasileiras, sobretudo na Bahia.
Suas principais pesquisas antropológicas e etnológicas
resultaram na publicação do Dicionário de Arte Sacra e Técnicas
Afro-Brasileiras.