Seguidores

domingo, 20 de maio de 2012

Mãe-d'Água salgada

As Religiões no Rio - João do Rio
No mundo dos feitiços - A Casa das Almas

Mas de repente Antônio parou entre as árvores.
- Temos ebó de iê-man-já. A negralhada vem ...
Se quer ver, esconda-se detrás de algum tronco.
Com efeito, sentiam-se vozes surdas ao longe, cantando.
O despacho, ou ebó, da mãe-d'Água salgada, é um alguidar com pentes, alfinetes, agulhas, pedaços de seda, dedais, perfumes, linhas, tudo o que é feminino.
Detrás da árvore, pouco depois eu vi aparecer no plenilúnio a teoria dos pretos.
À frente vinha uma com o alguidar na cabeça, e cantavam baixo.

Baô de ré se equi je-man-já
Pelé bé Apotá auo yo tô toro fym la cho
Ere...

Era o ofertório.
Ao chegar à praia, na parte em que há uns rochedos, a negra desceu, depositou o alguidar.
Uma onda mais forte veio, bateu, virou o vaso de barro, quebrou-o, levou as linhas e todos balbuciaram, rojando:

- Iê-man- já!

A santa aparecera na fosforescência lunar, agradecendo...
Depois os sacerdotes ergueram-se, reuniram e nós ficamos de novo sós, enquanto o oceano rugia e, ao longe, tristemente a canzoada ladrava.

João do Rio - As Religiões no Rio, João do Rio,
Domínio Público - Biblioteca Virtual de Literatura
Sobre o autor