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terça-feira, 25 de outubro de 2011

Daniel Lainé - Os reis vivos da África

Em 1983, ao passar por Ouagadougou (a capital de Burkina Faso), um amigo veio anunciar numa manhã, o falecimento de Moro Naba, o imperador dos Mossi.
Todos aqueles que conhecem Burkina Faso, sabem da importância de Moro Naba. Em seu palácio, situado no centro de Ouagadougou, ele governou segundo as tradições sobre todos os reinos que compõe o império Mossi.
Longe de ser uma simples memória do passado, o imperador ainda é, um elemento importante do poder sobrenatural.
Por mais de dez anos, eu acompanhei as cerimonias de enterro, coroação do sucessor, conheci gente que parecia estar profundamente implicada na tradicional sociedade Mossi, mas fiquei atônito ao perceber, que essas mesmas pessoas ocupavam importantes cargos administrativos e possuíam funções governamentais.
Apesar de representarem o futuro e a modernização, pareciam à vontade ao circularem no estranho mundo de Naba e sua corte de feiticeiros.
O continente africano é constantemente palco desses contrastes, onde mundos paralelos se sobrepõem, tornando-se difícil para um estrangeiro analisar.
Ainda existem algumas centenas de monarcas vivendo nesse continente. Enquanto alguns dentre eles estão relegados ao nível de curiosidades turísticas, outros ainda mantém seus poderes espirituais tradicionais de alta significância.
Nascidos de dinastias que marcaram a história da África até o século XX, esses reis são uma fonte de poder sobrenatural com que os “governos modernos" têm que coexistir.
Contrariamente aos Marajás, eles sobreviveram aos percalços da história, e transitam no mundo paralelo que é muito real.
Entretanto, para alguns africanos, eles representam a vergonhosa encarnação da falência de sistemas arcaicos diante da colonização ocidental.
São acusados de ser um entrave para o progresso do estado moderno devido ao seu conservadorismo tribal. Para outros, são os detentores das velhas bases culturais, a tabua de salvação diante da angustias e incertezas do futuro.
De qualquer modo, são uma presença inegável em seus países, uma realidade que precisa ser admitida.

Tamarin - A experiência africana

Motivado pela escassez de informações etnológicas sobre os monarcas africanos, eu resolvi pesquisar meticulosamente, para depois encontrar-me com os reis, para além das cidades frequentemente por estradas muito difíceis.
Para que fosse possível fotografá-los tive que me submeter quase sempre a complexos protocolos. Investi muito tempo, obstinação e algumas vezes dinheiro.
Muitas vezes ajudado por intermediários bem conhecidos nas cortes, sem os quais a aproximação seria impossível.
Em três anos, de 1988 a 1991, eu realizei doze viagens, que me favoreceram passar quase doze meses na África.
E mesmo assim não tive tempo para visitar o rei dos Shiluks, um descendente das dinastias negras que reinaram no Egito.
A guerra civil no Sudão tornou essa viagem complicada.
Durante o mesmo período, eu estive várias vezes em Oyo (Nigéria), sem encontra-me com o Alafin, de cujo reino iorubá dominou o sul da Nigéria durante vários séculos.
Durante essas diferentes viagens, eu tive que lidar com telefones que raramente funcionavam quando necessário, e transportes locais frequentemente lentos e perigosos.
Mas sempre tive dificuldades para adaptar-me ao conceito africano de tempo. No Zaire, entre autorizações necessárias, viagem e rituais que precediam o vestir dos trajes reais, levaram-me três semanas para conseguir fotografar o rei de Kuba. No Camerun, o Baba de Rey-Bouba me fez esperar oito dias dentro de uma cabana.
Na Nigéria, segui por quinze dias os passos do Oni de Ifé, que estava viajando constantemente pelo Pais. Na África do Sul, o rei dos Ndebelesme fez aguardar meio dia com seu conselho real, para depois exigir uma autorização do governo Kwa-Ndebele.
De secretários a escritórios, me deparei uma vez com um funcionário civil branco, que ameaçou expulsar-me por haver violado o estado de emergência. Foram dez dias de discussões, sem fotos.
Além disso, havia todo o resto: a viagem Africana. Os transportes locais e os encontros inesperados, os “bons sujeitos”, embaixadores ou camponeses, e os” maus sujeitos", que eu encontrei frequentemente nos ministérios mais do que nas ruas, momentos impressionantes com as majestades e seus súditos, no silencio e na comunhão dos rituais, dos ritmos, e do riso louco do destino africano que irrompia frequentemente.

Texto de Daniel Lainé

African Kings - Roi d´Afrique - Reis da África

Hoje em dia existem cerca de 100 reis tribais na África, vestígios de uma era, que conservou as antigas tradições.
African Kings nos mostra 70 de tribos e seus reis.
Daniel Laine fotografou no final da década de 80, setenta herdeiros das grandes dinastias africanas.
Levaram três anos (1988 - 1991) de intensos esforços diplomáticos para que Daniel Lainé realizasse esse trabalho fantástico. Durante esse período ele conseguiu fotografar 70 soberanos e descendentes das grandes dinastias Africanas.
Desde então, 12 anos atrás, vários reis já morreram ou desapareceram. É o caso do sultão de Sokoto, e os soberanos da D.R. Congo, que desapareceram desde o inicio da guerra civil.
Esse trabalho resultou num livro chamado, ROIS D´AFRIQUE onde os retratos formais e vistosos de cada rei, são acompanhados de biografias breves e de notas históricas sobre as tribos, os rituais e a historia de cada governante.
African Kings apresenta as raízes antropológicas profundas que ainda se conservam no novo milênio.
Inclui uma introdução histórica que proporciona uma apreciação global do papel do rei nas tribos africanas.
A vida de um fotógrafo
Nascido no dia 29 de Abril de 1949em Auxerre (França), Daniel desde cedo estabeleceu seu caminho.
Fascinado pelas viagens e terras distantes, ele foi sucessivamente, vendedor, mensageiro, escriturário, professor de francês no Peru, marinheiro no Caribe, gerente de hotel na Martinica, agricultor no Canadá, e agente de viagens na Índia e no Afeganistão.
Foi através dessas experiências que suas primeiras fotos foram publicadas em diversos jornais e revistas francesas como: Liberation, Partir and Grands Reportages.
Em 1980 ele ligou-se a equipe da agencia francesa de fotografia Gamma. De 1983 a 1983, ele foi o fotografo da revista francesa Actuel. Atualmente é um free lancer de fotografia e reportagens de TV.
Seu trabalho sobre os reis da África, lhe rendeu o prêmio da Villa Medicis em 1988, e o primeiro prêmio da World Press Photo em 1991.
Foi aprisionado no Camboja de 22 de Agosto a 9 de Setembro, quando saiu clandestinamente do Pais para refugiar-se na Tailândia. Seu passaporte havia sido confiscado pelas autoridades do Camboja.
Daniel Lainé não podia deixar esse Pais. A policia exigiu o pagamento de 125.000 dólares para “reparar o prejuízo" que sua reportagem sobre o turismo sexual no Camboja para a televisão francesa, poderia ter causado.