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quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Dançarinos sobre penas de pau em funeral Dogon - Mali

Os bailarinos dogon sobre pernas de pau usam esses trajes feitos de fibras de hibisco, búzios e conchas de coco sobre o peito para imitar os movimentos das aves pernaltas com o movimento dos braços.
Todavia é dito maliciosamente pelos anciãos que seus movimentos representam as mulheres Fulani de tribos vizinhas, altas e com seios pontudos.
No Mali, pais africano situado na fronteira do Saara com as savanas da África Ocidental, e a uns 1.500 quilômetros do Atlântico, encontram-se nos precipícios de Bandiagara. 
Coladas às paredes dos precipícios e construídas ao redor de cavernas, veem- se construções de barro com teto de palha, algumas a 200 metros do solo. 
O acesso é feito por escadas estreitas entalhadas nas encostas da montanha.
Nelas vivem os Dogons, um povo muito diferente dos outros povos africanos, e suas moradias são lugares interditados aos estrangeiros. 
Segundo uma tradição oral, chegaram ao Mali faz uns 600 anos e construíram essas casas nos precipícios para proteger-se dos ataques das tribos que habitavam a região.
Os Dogon são uns dos numerosos grupos étnicos que habitam o altiplano central de Mali e em Burkina Faso (o antigo Alto Volta). 
Seu território se esta situado no Sael, a zona semiárida de transição entre o Saara ao norte e as úmidas áreas tropicais do sul. 
Trata-se de uma região de savanas herbáceas e arbustos dispersos, na qual a chuva e a terra arável são escassas. 
Os dados populacionais são estimados entre 100.000 e 500.000 indivíduos, a maioria dos quais vivem nas colinas rochosas, nas mesetas e montanhas dos distritos de Bandiagara e Douentza, no Malí. 
No primeiro desses distritos, a maioria da população esta concentrada em una franja de uns 140 quilômetros de largura, correspondente aos chamados riscos de Bandiagara. 
Denominam-se a si mesmos "Dogon" ou "Dogom" ("Dogo" no singular), mas segundo fontes antigas costumam ser mencionados como "Habe", a palavra Fulbe que significa "estrangeiro" ou "pagão".
A classificação correta de seu idioma esta sujeita a duvidas e controvérsias, sendo habitualmente classificado dentro do grupo Voltaico. 
A historia dos Dogon vem de tradições orais. 
Supõe-se que seu lugar de origem era na ponta oeste do Níger, entre os séculos X e XIII DC. 
De acordo com a lenda, os antepassados dos Dogon foram quatro irmãos de origem sobrenatural, chamados Dyon, Arou, Domno y Ono, que "devido a uma disputa em sua pátria Mande decidiram deixar Mande e encontrar uma nova terra onde eles e seus descendentes poderiam viver em paz". 
Ainda hoje os habitantes das diversas regiões costumam afirmar seu parentesco ligado a um destes ancestrais míticos.
Inicialmente emigraram ao norte e oeste de Burkina Fasso, onde as historias locais descrevem-nos como os "Kibsi".
Acredita-se que por volta de 1490 fugiram deste território ao ser invadido pela cavalaria dos Mossi, refugiando-se nos riscos de Bandiagara.  Ai substituíram os antigos Tellem, de quem se se sabe pouca coisa. 
É um povo essencialmente agrícola. 
Menos da metade dos Dogon são muçulmanos, e menos ainda cristãos, a maioria pratica a religião tradicional.
Os vilarejos Dogon costumam agruparem-se em quatro o cinco unidades nas proximidades das fontes de agua. 
Cada uma destas agrupações forma um cantão ou região, que constitui uma unidade geográfica, linguística e étnica. 
Cada região possui um dialeto diferente que às vezes é consideravelmente diferente das outras.
Os habitantes de uma determinada região consideram seu parentesco com um antecessor comum. 
A organização dos vilarejos esta baseada no parentesco de seus membros, dentro de um padrão de linhagens patrilineares exógamas, (denominadas "Ginna"). 
O filho mais velho chamado de "Ginna bana" que exerce a chefia, é o descendente de um ancestral comum dentro da linhagem local.
O Ginna bana conduz as cerimonias religiosas e preside o conselho de anciãos que governa cada vilarejo.
Ele é o descendente direto do fundador, o "Hogon", e exerce a liderança do cantão, além da guarda espiritual do culto "Lebe". 
É considerado "o mais puro dos homens puros" e seu campo é sagrado. 
Uma parte distinta do sistema social dos Dogon é a existência de diversas castas ocupacionais, entre as quais se incluem a dos trabalhadores de ferro, em couro e madeira.
Entre estas também figuram os "griots", que cumprem funções de historiadores orais, genealogistas, poetas, músicos e feiticeiros.
Os membros destas castas vivem separados dos agricultores, fora das vilas, ou em vilas próprias. 
Cada uma destas castas é endógama, e seus membros não participam dos cultos religiosos comuns. 
A sociedade Awa é uma sociedade masculina secreta que controla o celebre culto das máscaras e prepara a cerimonia Sigui (o "Culto da Grande Máscara"). 
Os Awa se caracterizam por rigorosas normas de etiqueta, obrigações, interdições, e uma linguagem secreta (a "linguagem da malicia" ou "Sigui so"). As mulheres e as crianças são sumariamente excluídas. 
A sociedade Awa divide-se de acordo com a idade, ignorando-se as linhagens tradicionais e o cargo hierárquico dentro das vilas. 
Os jovens são iniciados nesta sociedade durante a adolescência, mas apenas alguns deles são escolhidos para serem instruídos em todos os secretos do culto, com a responsabilidade de preservar a tradição das máscaras durante a vida. 
Esses recebem sua iniciação na cerimonia Sigui, celebrada uma vez a cada sessenta anos. 
O líder da sociedade Awa, é o "Olubaru", o "mestre da linguagem e da malícia", e líder dos "homens impuros". 
Os Dogon dividem sua comunidade em duas categorias opostas, chamadas innenomo ("homem que vive", traduzido como homem puro) e innepuru ("homem impuro", ou também "homem morto"). 
Os papeis de puro e de impuro se definem em termos de responsabilidades rituais, proibições e direitos a assumir certas funções; formam uma oposição ritual alheia a hierarquia da linhagem, da idade, e do lugar.
O status de "puro" ou "impuro" se estabelece no momento do nascimento, herdado de algum antepassado recentemente falecido. 
Os impuros realizam os rituais associados à morte, tais como a preparação e enterro do cadáver e o sacrifício e consumo de animais sagrados. 
Os homens impuros são proibidos do contato com o campo sagrado do Hogon. O estado impuro é um requisito para exercer as funções de Olubaru. 
Os homens puros estão proibidos de atividades rituais associadas à morte.
O Olubaru e a sociedade Awa assumem o controle da comunidade durante seus períodos cerimoniais, enquanto o Hogon é o chefe durante o resto do ano e se ocupa das responsabilidades sagradas durante a época dos rituais agrícolas.
A transmissão do cargo de Olubaru acontece fora do vilarejo, e o direito a assumi-lo está completamente separado de a hierarquia habitual da mesma. 
A fabricação e uso das máscaras não é exclusivo da cerimonia Sigui; elas também são usadas se no festival da semeadura, nas cerimonias funerárias, e nas cerimonias "Dama" (conclusão do período de luto). 
Os Dogon possuem quatro cultos principais: o culto "Wagem" (relacionado com os ancestrais) chefiado pelo Ginna bana, o culto Lebe chefiado pelo Hogon (associado com o ciclo agrícola), o culto "Binu" (totêmico), dirigido pelo "Binukedine", e o culto da sociedade Awa, chefiado pelo Olubaru. 
Esses quatro cultos estão integrados num único sistema religioso. 
Os quatro lideres dos cultos são comparados com os quatro irmãos sobrenaturais, e por sua vez, as quatro direções da cosmogonia Dogon.
Este sistema religioso pode ser compreendido em termos de oposição entre o Ginna bana e o Olubaru por um lado, ambos "impuros", e pelo Hogon e o Binukedine por outro, ambos "puros". 
Esta oposição se acha enraizada na mitologia e na forma de ver o mundo deste povo. 
A terra não arável, a malicia, são consideradas como desordenadas e impuras, morada de forças sobrenaturais, enquanto as vilas e as terras cultivadas são consideradas ordenadas e puras. 
O Hogon, líder do culto Lebe e dos homens puros cultiva um campo sagrado e puro; a malicia é o domínio da "raposa pálida" (o Chacal dourado) o primeiro filho o do criador Amma, e deturpador de sua criação.


Uma cosmogonia Dogon


A cosmogonia Dogon não é menos complexa e imaginativa que sua organização social. 
Segundo uma de suas versões (existem varias, que diferem em muitos detalhes), Amma, o deus criador, fez as estrelas lançando bolinhas de barro ao espaço, e o Sol e a Lua como obras de confeitaria. 
Em seguida criou a Terra comprimindo em sua mão uma bola de argila, lançando-a em seguida junto as estrelas.
A bola se estendeu formando um corpo feminino, no qual um cupinzal formou o clitóris e o formigueiro a vagina.
A primeira ruptura na ordem do mundo aconteceu quando Amma quis copular com a Terra, mas o cupinzal (o clítoris, que representa a masculinidade), o impediu, e Amma começou então a cerca-lo. 
A consequência do impedimento inicial deste ato sexual resultou defeituoso, e dessa união nasceu uma única criatura, o Chacal dourado, que é o símbolo das dificuldades de deus. 
Muma, a agua, que é considerada o gérmen divino, é a segunda cópula que penetrou na Terra, pois a excisão do seu clitóris havia subtraído a causa da desordem original. (Caos)
Desta concepção perfeita nasceram os gêmeos divinos chamados "Nummo", produtos homogéneos de deus e de sua mesma essência. 
Apesar de Nummo referirem-se a uma dupla de gêmeos, os Dogon acostumaram a usar a forma singular para referir-se a eles. 
Em seguida, Nummo subiu ao céu para receber as instruções de seu pai. 
De la de cima viu sua mãe, nua e sem fala; para por cabo a esse estado de caos desceu de novo a Terra, e com fibras de plantas das regiões divinas cobriu a sua nudez. 
Isso dotou a Terra da primeira linguagem do mundo. 
Nesse momento ressurgiu o Chacal, "o filho errado de deus", que interveio introduzindo novamente a desordem na criação ao cometer incesto com sua mãe. 
Deste modo, o Chacal usurpou a linguagem divina e produziu o fluxo menstrual, que manchou as fibras divinas. 
Por essa impureza Amma rechaçou sua esposa e decidiu a criar seres vivos diretamente, modelando-os em argila úmida. 
Surgiu assim o primeiro casal humano; cada um de seus membros foi dotado por Nummo de duas almas, uma masculina e outra feminina. 
Sem duvida, Nummo não tardou em compreender as desvantagens de possuir duas almas, e começou a circuncidar ao homem para eliminar a sua parte feminina. 
Então o homem copulou com a mulher, gerando os primeiros dois filhos de uma serie de oito, que foram os antepassados do povo Dogon. 
A natureza desses oito antepassados era dual e bissexual, eles desconheciam a morte. 
Reproduziram-se e eventualmente, entre diversas vicissitudes, foram levados ao céu por Nummo, para serem aperfeiçoados pela água e pela palavra. La no céu por sua vez, eles se transformaram em Nummo. 
Nesse momento, ocorreu uma nova ruptura, devido ao fato desses recém-chegados não resignarem-se a acatar as regras do Nummo original.
O primeiro e o segundo antepassados, decidiram então abandonar o céu, "aonde se sentiam estrangeiros", sendo acompanhado pelos outros seis.
Uma vez de volta a terra procederam à ordenação natureza e da sociedade humana, introduzindo a agricultura, o trabalho em metal e a tecelagem, no mundo. 
Nesta mitologia o Chacal é uma criatura desnaturada, que quebra a ordem social; é um símbolo da "unidade", do varão sem o complemento feminino. 
Para os Dogon, o caos é o resultado do desequilíbrio entre qualidades masculinas e femininas. 
Entretanto, o equilíbrio dos sexos que leva ao funcionamento apropriado do cosmos esta ilustrado nas historias dos Nummo, seres andróginos. 
No mito, os Nummo são heróis culturais que introduzem as artes e conhecimentos úteis e que restituem a ordem perdida, no mundo humano e por vezes também representam o poder vitalizador da água, que faculta a agricultura e a organização social num entorno hostil.


Foto de Carol Beckwith e Angela Fisher


As fotógrafas Beckwith e Fisher realizaram um autêntico trabalho antropológico durante os trinta anos que levaram fotografando as cerimônias da África. 
Aproveitando a desvantagem aparente de sua condição feminina e graças à sua adversidade, conseguiram ganhar a confiança dos homens e mulheres das diversas tribos que visitaram, aceitando registrar sua vida cotidiana e seu mundo espiritual de uma maneira que nenhum homem conseguiu antes.